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segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Festival de Brasília termina e tem debate sobre futuro do festival

Controverso. A palavra serve para resumir o 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, que termina hoje. Os debates em torno da nova configuração da mostra mais antiga do país — que, entre outras mudanças, derrubou a preferência por filmes inéditos na competição e entrou na era digital — incluiu realizadores, produtores e críticos durante os sete dias de mostra, contaminando os corredores e as salas de projeção. Apesar disso, a discussão ainda está longe de render uma conclusão unânime sobre as polêmicas da temporada.
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A mais incômoda das alterações, sem dúvida, foi a seleção de filmes não inéditos —o festival repetiu títulos exibidos anteriormente no Paulínia Festival de Cinema e Festival de Gramado. A cobertura feita por veículos da imprensa nacional, com isso, se tornou menos atrativa. Não foram poucos os jornalistas que deixaram o Cine Brasília antes das sessões de Meu país e Trabalhar cansa, que estrearam em Paulínia, depois de assistir aos curtas. “Vou morrer defendendo o ineditismo no Festival de Brasília”, afirma a jornalista e pesquisadora Maria do Rosário Caetano, que participa do evento desde 1975.

Rosário acredita que exibir filmes exclusivos é um fator importante para diferenciar Brasília das cerca de 300 mostras cinematográficas que são realizadas no país. “Se as cinco principais não exibem material inédito, vira uma indústria de festivais”, aponta. Rosário também analisa que a seleção de filmes não deve privilegiar apenas novatos, como aconteceu em 2010. “É da fricção entre estreantes e veteranos que se faz um festival forte. Não se pode fazer festival de gueto. Brasília não pode virar uma sucursal de Tiradentes (mostra que destaca filmes de novos cineastas), nem pode caducar”, aponta.

A mesma impressão é corroborada por outros profissionais da área. “A mudança de data dá as condições para atrair filmes que antes migravam para outras mostras. Este sempre foi um festival que privilegiou o vanguardismo na seleção de filmes e agora seleciona títulos manjados. Brasília tem de definir se quer fazer uma mostra de caráter regional, interessante para o Distrito Federal, ou continuar tendo relevância nacional”, analisou Luiz Zanin, presidente da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine), que acompanha o Festival de Brasília desde 1991.

Para o diretor da distribuidora Imovision, Jean-Thomas Bernardini, a questão do ineditismo passa a ser necessária apenas quando há uma safra de filmes ruins. O desafio de Brasília, segundo ele, é marcar que identidade será assumida. “Para nós, distribuidores, é importante conhecer a identidade de cada mostra e escolher onde inscrever nossos filmes. Brasília tem de definir uma cara, não importa que cara seja”, afirmou.

A ser exibido nas salas a partir da próxima sexta, o longa Meu país, por exemplo, pode “usufruir do festival como uma plataforma de lançamento”, como admitiu o diretor André Ristum. A estratégia foi qualificada como “incrível”. “É uma exposição sensacional, num festival que tem destaque em todo o Brasil. Para mim foi sensacional poder usar isso como alavanca para o filme. Não acho que seja negativo para um festival que isso aconteça. Ao contrário: se a gente for ver Cannes, por exemplo, tem lançamentos que entram no circuito no dia seguinte nos Estados Unidos e na França. Os melhores festivais do mundo misturam filmes que não passariam a não ser em festivais com títulos de trajetória já definida”, observa o realizador.

Sugestões
No engate da finalização da mostra, uma nova rodada de discussão a respeito do futuro do festival a partir de 2012, ano em que a mostra alcançará a marca de 45 edições, começa. “Não posso definir como será no ano que vem. Eu sou coordenador do festival, mas não sou funcionário da Secretaria de Cultura do Distrito Federal. Posso apenas deixar um conjunto de sugestões para o órgão”, esclarece Nilson Rodrigues. “No meu ponto de vista, antes da questão do ineditismo, o mais importante é pensar na qualidade dos filmes que serão exibidos. Os filmes são o insumo de qualquer mostra de cinema e o destinatário deles é o público”, esclareceu.

Entre as sugestões que Rodrigues planeja encaminhar para a Secretaria de Cultura está a separação da mostra competitiva de longas-metragens em ficções e documentários, o aumento do número de filmes selecionados para a competitiva e um número maior de mostras paralelas. “Se isso acontecer, haverá sim uma programação com horários conflitantes. É preciso que as pessoas se acostumem com isso. Quando um festival se quer grande tem de ser assim. Um exemplo é o Festival do Rio, que sem isso não seria o grande panorama que é atualmente”, comparou o coordenador.

O loteamento da mostra competitiva, que este ano abriu um flanco para curtas de animação, pode ser visto mais como problema do que como solução. “Brasília nunca teve preconceitos com gêneros e formatos. Já premiou documentários e animações. Por que separá-los em competições específicas? Por que simplesmente não aumentar o número de filmes na disputa?”, questiona Maria do Rosário. “Criar uma competição para documentários seria um retrocesso”, avalia.

Vitrine brasiliense
A mudança da principal vitrine do cinema brasiliense, a Mostra Brasília, que saiu do Cine Brasília para o Museu da República, foi uma das situações que gerou mais barulho dentro da comunidade cinematográfica local. A mostra ganhou um novo horário com exibições todos os dias, à tarde, para que todos os 63 filmes (que não passaram por qualquer critério de seleção) fossem exibidos. “No momento em que a revolução digital promove um novo olhar para a identidade regional, o Festival de Brasília deixou a mostra do cinema brasiliense num local isolado, de difícil acesso e pouco atrativo”, analisou o cineasta de Brasília Geraldo Moraes.

“As sessões que aconteciam entre as 16h e as 19h no Cine Brasília atraíam jornalistas e realizadores de outros estados. Isso facilitava o intercâmbio profissional”, recorda o diretor de fotografia André Carvalheira. “Esta é outra sugestão que iremos encaminhar para a secretaria. Do jeito que está (sem pré-seleção de filmes), a Mostra Brasília não deve ser exibida no Cine Brasília. É preciso que uma seleção seja feita. Aí sim, com a mostra enxuta e qualificada, que deve ocupar o espaço nobre do Festival”, respondeu Rodrigues.

Defendendo o curta-metragem Exu iluminado, na competição da Mostra Brasília, o tarimbado diretor André Luiz Oliveira se disse satisfeito com as mudanças. “Acho o Museu da República perfeito. A cobrança dos jovens realizadores pelo deslocamento do templo que é o Cine Brasília é justa, por serem jovens. Para mim, não procede: é um fetiche com relação ao Cine Brasília. O espaço do museu pode vir a ser exatamente um marco zero. A revolta é inócua, típica da juventude. Acho fundamental um espaço consagrado para o primeiro filme. Imagina a frustração de um cara fazer seu longa e depois não ter onde passar? Lá tem lugar, e achei muito bacana”, avalia. André Luiz achou a juventude “muito conservadora”. “Lá no museu se viu coisas absolutamente ridículas, mas é bom passarem. O cara tem que experimentar e, ano que vem, chega com um filme melhor. O espaço das pessoas sentadas no chão, no museus, era mais importante do que o do Cine Brasília. Lá pode vir a ser um templo do cinema jovem”, comemorou.

Outra queixa de cineastas e entidades de cinema foi uma suposta redução de diálogo com a Secretaria de Cultura. A impressão de desgaste foi notada por Maria do Rosário. “É preciso reconciliar o cinema brasiliense com o festival. A Mostra Brasília tem que voltar a ser exibida às 17h, no Cine Brasília”, opina. Sobre isso, Rodrigues pondera que encontros precedentes ao festival foram realizados. “O secretário Hamilton Pereira recebeu representantes do setor acadêmico e da produção cinematográfica. Eles efetivaram uma série de sugestões. O secretário tem sido democrático e discutido sempre. Agora, o diálogo tem de ser de mão dupla. Os produtores e realizadores devem entender isso senão não sairemos do microcorporativismo. O Festival de Brasília é referência para o Brasil inteiro e não só para o Distrito Federal”, afirmou.


CERIMÔNIA DE PREMIAÇÃO
Entrega de troféus e prêmios do 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Hoje, às 20h, no Cine Brasília. Acesso apenas para convidados. O evento será transmitido ao vivo pela TV Brasil.

fonte:Pernambuco.com